"Todo aquele que ler estas explanações, quando tiver certeza do que afirmo, caminhe lado a lado comigo; quando duvidar como eu, investigue comigo; quando reconhecer que foi seu o erro, venha ter comigo; se o erro for meu, chame minha atenção. Assim haveremos de palmilhar juntos o caminho da caridade em direção àquele de quem está dito: Buscai sempre a Sua face."

Agostinho de Hipona



quarta-feira, 12 de setembro de 2018

“Sigam-me, e eu os farei pescadores de homens”

Por Christian Gillis 
Seguimento, igreja e serviço
Na jornada de seguir a Jesus descobre-se que há muitos peregrinos caminhando na mesma trilha de discipulado, alguns mais adiante, uns entrando agora na rota, outros parados ou caídos. Ainda que o ponto de partida em seguir a Jesus comece com uma resposta pessoal, que passa pelo coração, ao chamado para viver sob o reinado de Deus, ser discípulo de Jesus não consiste em um andar solo. 

Tudo começa com a percepção de que o tempo do governo de Deus foi inaugurado efetivamente pelo ingresso do Messias na história que desperta a fé e chama à metanoia, à mudança de mentalidade e vida (Mc 1.14-15). A partir daí é seguir a Jesus, andar após e perto do Senhor, para aprender os princípios e a cultura do reino de Deus.

Tão logo a caminhada começa encontram-se companheiros, igualmente chamados pelo Senhor, que também disseram sim ao Rei, que deixaram algumas realidades para trás e que aderiram à escola de Cristo. O convívio com outros seguidores não é meramente circunstancial, mas fundamental na formação dos discípulos, segundo a didática de Jesus. A interação de uns com os outros, a reciprocidade e o exercício da mutualidade ao andar juntos, o ouvir as perguntas, as considerações e percepções dos outros e até mesmo as disputas e os conflitos interpessoais são plataforma didática para a compreensão dos mistérios do reino de Deus e, principalmente, a constituição de um povo que tem Jesus como modelo. 

Seguir a Jesus não consiste em acumular conhecimentos e teologias, mas em tornar-se plenamente humano. Por isso o processo de discipulado é principalmente grupal. A dinâmica dos relacionamentos e vínculos com outros seguidores tem funções humanizadoras tanto da pessoa como da constituição da comunidade dos discípulos (Igreja). Aprender a amar o próximo começa no círculo dos seguidores de Jesus. Aprender a ser verdadeiro, aceitar o outro, perdoar, desenvolver companheirismo e servir se tornam algo real na esfera dos discípulos. O modo amoroso como os discípulos se relacionam entre si será o maior testemunho e a melhor contribuição que poderão transmitir ao mundo (Jo 13.35; 1Co 13).

Mas, se seguir a Cristo é relacionar-se com o Mestre e com os colegas de jornada, em uma perspectiva de serviço ao mundo, existe um problema. É que especialmente em dias de acentuado individualismo, relacionamentos virtuais e companheirismo líquido desaprendeu-se a conviver. As relações têm se tornado superficiais, instáveis, competitivas e utilitárias. Como ser discípulo e coletivo, servindo a Deus e aos outros nessa crise relacional?

É imperativo, então, que os seguidores de Jesus caminhem juntos, permaneçam unidos e redescubram a arte de relacionar-se e viver em comunidade, para que experimentem a transformação intencionada pelo Senhor, isto é, tornar-se gente saudável que tem potencial de agregar, acolher e integrar pessoas.

A natureza do seguir entabula, quase que ao mesmo tempo, um relacionamento com o Mestre, mas também o convívio horizontal uns com os outros, a inserção num corpo, para, então, transformar discípulos em agentes que servem ao reino de Deus no mundo, comunicando com amor efetivo o amor redentor revelado em Jesus Cristo.

O companheirismo e serviço são integrantes essenciais do plano de curso desenvolvido por Jesus em perspectiva missional. A missão é mais que a proclamação das realidades do reino por meio de palavras e serviço; é a plantação de uma semente de comunhão fraterna, para cuidar do mundo e produzir abrigo e restauração.


Senhor Jesus, agradecemos por abrir o caminho do discipulado e nos convidar a também tomar nossa cruz. Para prosseguir na trilha dos teus passos, ajuda-nos a ser mais dispostos e disponíveis à comunhão com os irmãos e irmãs, para que o mundo nos veja e glorifique o teu nome. Amém!


Seguimento e Imitação

Ser seguidor de Jesus é ser seu aluno ou aprendiz. Jesus ensina e exemplifica em si mesmo a sabedoria para viver a vida segundo o conselho de Deus. Constitui-se objetivo do chamado a seguir a Jesus a identificação com o caráter e a experiência do Mestre. Sua vida é um roteiro existencial para os seguidores. Discipulado, muito mais que uma metodologia para crescimento eclesial, é o cultivo de um estilo de vida.

Passar a seguir a Jesus é atravessar um portal que insere a pessoa em uma nova dimensão e perspectiva de vida – que parece estar de ponta-cabeça quando comparado ao que é valor na presente ordem desse mundo. Jesus é a referência e o paradigma a serem imitados na nova conjuntura do reino de Deus. Os princípios mais importantes comunicados pelo Senhor são aqueles que o distinguem como pessoa e o autenticam como modelo singular, arquétipos demonstrados em si mesmos.

Cada seguidor de Jesus, então, é chamado a copiar, cultivar e aplicar no seu círculo relacional as mesmas atitudes fundamentais vivenciadas por Jesus – “Seja a atitude de vocês a mesma de Cristo Jesus” (Fp 2.5). Jesus, embora sendo igual a Deus, não se apega ao seu maravilhoso estado de glória, antes, esvazia-se a si mesmo, torna-se semelhante às pessoas, gente de carne, osso e cultura, e, encontrado na forma humana, assume a condição de servo – de Deus e da humanidade –, servo que leva o compromisso com os valores do reino de Deus às últimas consequências.

É desse modo que Jesus é o modelo de pessoa inteira, que exemplifica o “negar-se a si mesmo” com o desapego, o deixar de lado condições gloriosas para servir, o esvaziar-se em função da missão e o assumir contextualmente a forma humana com a intenção de obedecer radicalmente – o “tomar a sua cruz”. Somos chamados a praticar em nossa existência essas mesmas atitudes e posturas que Jesus escolheu e assumiu. O resultado de ressurreição e glorificação também serão realidades plenas para aqueles que primeiro seguem ao Senhor no descenso, desapego, esvaziamento, encarnação, serviço e humildade.

Andar nas pegadas de Jesus significa tanto imitá-lo nas suas escolhas existenciais decisivas como também aprender a praticar e obedecer – não apenas saber – a todos os mandamentos que ordenou. A maior marca da pessoa, vida, ensinos e ministério de Jesus foi o amor. Foi o amor, dirigido a um mundo que não merecia, que o moveu para a cruz. Assim, Jesus se tornou a expressão exata do amor, a imagem visível do que é amar e servir. Jesus, então, designou aos seus seguidores o mandato de também ser gente prestativa, que toma a iniciativa de fazer o bem e considera o interesse dos outros – não de buscar as vantagens, o centro ou o primeiro lugar.

Quando Jesus enviou seus seguidores ao mundo, como havia sido enviado pelo Pai (Jo 20.21), impulsionou seus discípulos a atravessar sem medo todo tipo de fronteira e barreira, caminhando missionalmente em direção a todas as pessoas e povos a partir dos marcos do altruísmo, do serviço, da unidade, de modo a reproduzir seu modo de vida e tipo de ministério por toda a terra. Isso significa que cada seguidor e o conjunto de seguidores de Jesus de Nazaré manifestam o amor de Jesus rejeitando todas as formas de xenofobia e racismo, onde quer que transitem. A peregrinação cristã expressa amor na forma de integração em vez de segregação, inclusão em vez de exclusão, pluralidade em vez de divisão, tolerância em vez de violência, parceria em vez de imposição da vontade, solidariedade em vez de desqualificação do outro. Esse é o modelo que as pegadas de Jesus ensinam.


Deus, eu preciso de graça. Graça para ser cheio da lógica do teu reino. Graça para imitar o Filho, Jesus. Graça para agir conforme o exemplo, o paradigma do Senhor. Graça para refletir os valores eternos aqui no meu tempo e cultura. Por mim mesmo não dou conta. Amém!
• Christian Gillis é casado com Juliana e pai de três filhos. É pastor da Igreja Batista da Redenção, participa do conselho coordenador da Aliança Evangélica e integra a governança de Miqueias Brasil.

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