"Todo aquele que ler estas explanações, quando tiver certeza do que afirmo, caminhe lado a lado comigo; quando duvidar como eu, investigue comigo; quando reconhecer que foi seu o erro, venha ter comigo; se o erro for meu, chame minha atenção. Assim haveremos de palmilhar juntos o caminho da caridade em direção àquele de quem está dito: Buscai sempre a Sua face."

Agostinho de Hipona



segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Ame e odeie o mundo

"Porque Demas me desamparou, amando o presente século, e foi para Tessalônica, Crescente para Galácia...”"  (2 Tm 4.10)
 
Há uma grande diferença entre amar toda a criação de Deus e amar "este século" (ou ao "mundo", palavra que ainda nos causa confusão). Defino aqui mundo como a produção humana e seu conjunto de experiências que acabam tornando a vida uma loucura, sem espaço para Deus; uma auto-suficiência idólatra onde as pessoas agem como se elas fossem deuses, criando um sistema de vida viciado na busca pelo prazer individual e no pleno exercício da ganância; o humanismo secular.
 
Logo, alguns concluem que devemos nos proteger de toda essa mazela mundana. A implementação disto seria, portanto, viver em uma comunidade isolada e cujo centro é a estrutura eclesial. Criaríamos um gueto alternativo que se exime dos processos da vida social, à margem dos espaços públicos de construção e manutenção, visto que são estruturas possuídas pelo maligno e se envolver implicaria em apaixonar-se por elas, em se misturar com o profano. Sem falar na perda de tempo em tratar de assuntos que não os levaria a um encontro com o "divino". Outra consequência seria o esmagamento das culturas, a demonização das expressões artísticas e o empobrecimento intelectual. O que resta é uma espiritualização mística doentia fruto de uma polarização platônica e maniqueísta, onde tudo que de louvável existe está no metafísico.
 
Tudo isto não passa de um grande equívoco. O medo da vã paixão não pode paralisar o amor pela criação de Deus, nem deve ser desculpa para nos eximirmos de nossa co-responsabilidade na redenção de todas as coisas. O verdadeiro amor é capaz de nos mobilizar para superar o medo e seguir adiante, exercendo nossa mui santa vocação cristã: a de transformar a sociedade.
 
Lutamos pela transformação da sociedade não porque estamos apaixonados por este mundo, mas porque o cidadão do Reino deve provocar uma influência benéfica natural no lugar onde está. Faz parte de quem o cristão é agir de forma construtiva, sinalizar o Reino e a esperança através do amor. A misericórdia ativa e globalizada está no "DNA" dos filhos de Deus.
 
Somos tentados diariamente a agir como Demas (2 Tm 4.10), a abandonar o front, esquecer da realidade futura do reino. Esquecemos que há um lugar preparado para nós ao qual nenhum lugar se compara e que nenhum homem é capaz de conjecturar. Somos tentados a esquecer que as estruturas deste mundo devem ser transformadas porque são más, que sua aparente beleza e auto-suficiência não passam de engano mortal.
 
Nosso lugar não é na fuga alienante da realidade, mas também não é na paixão por ela (ou na suposta possibilidade de viver uma vida maravilhosa distante de Deus), mas na intervenção transformadora, cumprindo o propósito para qual fomos criados, que é caminhar com o mestre fazendo boas obras de misericórdia.
 
Não amar este século não quer dizer renunciar à felicidade, tampouco deixar de apreciar o que é belo nesta terra, mas saber admirar a criação sem se deixar dominar por ela. Aproveitar cada segundo desta vida olhando através das lentes do próprio Criador, e estar pronto para deixá-la quando Ele assim o quiser. A espiritualidade cristã consiste em humildemente amar a si e amar toda criação de Deus, sem a pretensão de ofuscar o brilho da glória de Deus, de onde emanam todas as coisas realmente belas. 
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Eric Rodrigues, 27 anos, é pastor anglicano, obreiro da escola Avalanche Missões Urbanas, articulador da Rede FALE e faz parte da coordenação estadual do Movimento Terra, Trabalho e Liberdade (MTL)


ULTIMATOONLINE

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Salvação: dádiva de Deus e não conquista do homem



A salvação não é um prêmio que recebemos por causa das nossas obras, mas um presente que recebemos por causa da graça. Não conquistamos a salvação pelo nosso esforço, recebemo-la pela fé. Não é resultado do que fazemos para Deus, mas do que Deus fez por nós. Falando a Nicodemos, Jesus destacou essa verdade axial no versículo mais conhecido da Bíblia: “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira, que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna”. Nesse versículo nós encontramos sete verdades preciosas acerca dessa tão grande salvação. 

Em primeiro lugar, a salvação é grande pela sua procedência. “Porque Deus amou…”. O Deus Todo-poderoso, criador do universo e sustentador da vida tomou a iniciativa de nos amar, mesmo antes da fundação do mundo. Seu amor por nós é eterno, deliberado, autogerado e incondicional. Deus não nos amou por causa dos nossos méritos, mas apesar dos nossos deméritos. A causa do amor de Deus não está em nós, mas nele mesmo.

Em segundo lugar, a salvação é grande pela sua amplitude. “Porque Deus amou ao mundo…”. Deus amou as pessoas de todos os tempos, de todas as raças, de todos os lugares, de todas as classes e de todos os credos. Amou não aqueles que o amavam, mas amou-nos quando éramos fracos, ímpios, pecadores e inimigos. Amou-nos não porque correspondíamos ao seu amor, mas amou-nos apesar de nossa rebeldia. 

Em terceiro lugar, a salvação é grande pela sua intensidade. “Deus amou ao mundo de tal maneira…”. Essa expressão de “tal maneira” aponta para o amor singular, incomparável e superlativo de Deus. Seu amor não foi apenas falado, mas demonstrado. Demonstrado não com cenas arrebatadoras, mas com o sacrifício supremo. O amor de Deus não foi esculpido com letras de fogo nas nuvens, mas demonstrado na cruz. 

Em quarto lugar, a salvação é grande pela sua dádiva. “Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito…”. Deus não deu ouro e prata nem mesmo um anjo para a nossa redenção. Deus deu tudo, deu a si mesmo, deu o seu único Filho. Deu-o para que ele se esvaziasse e vestisse pele humana. Deu-o para que seu Filho fosse rejeitado e desprezado entre os homens. Deu-o para que seu Filho suportasse o escárnio das cusparadas e suportasse a maldição da cruz. Deu-o como sacrifício para o nosso pecado. 

Em quinto lugar, a salvação é grande pela sua oportunidade. “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê…”. A salvação não é recebida como fruto do merecimento, mas como resultado da graça mediante a fé. A salvação não é dada àqueles que se julgam santos nem àqueles que praticam boas obras com o propósito de alcançarem o favor de Deus. A salvação é oferecida gratuitamente àqueles que crêem em Cristo. Não é crer em anjos nem em santos, mas crer em Jesus, o Filho de Deus. Jesus é o caminho para Deus, a porta do céu, o único mediador que pode nos conduzir ao Pai.
 
Em sexto lugar, a salvação é grande pela sua libertação. “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira, que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça…”. A salvação é o livramento da ira vindoura, é a soltura das cadeias da morte, é a alforria dos grilhões do inferno. Aqueles que permanecem incrédulos perecerão eternamente. Aqueles que se mantêm rebeldes contra o Filho jamais verão a vida nem desfrutarão do paraíso de Deus. Aqueles que não beberem da Água da Vida, terão que suportar o fogo que nunca se apaga. 

Em sétimo lugar, a salvação é grande pela sua oferta. “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê, não pereça, mas tenha a vida eterna”. Deus não apenas livra da condenação os que crêem, mas também oferece a eles vida eterna. A vida eterna é uma perfeita e íntima comunhão com Deus pelo desdobrar da eternidade. A vida eterna será como uma festa que nunca mais vai acabar, no melhor lugar, com as melhores companhias, com a melhor música, com as melhores iguarias, trajando vestes alvas. Enquanto a eternidade durar, desfrutaremos dessa gloriosa vida. Bendito seja Deus por tão grande salvação!

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

O diabo anda por aí

Jó 1.7 nos leva a 1Pedro5.8 e 1Pedro 5.8 nos leva a Jó 1.7

Na primeira passagem, Deus pergunta ao diabo: “De onde você vem vindo?” E o anjo caído responde: “Estive dando uma volta pela terra, passeando por aqui e por ali.”. na segunda, Pedro exorta: ”Estejam alertas e fiquem vigiando porque o inimigo de vocês, o diabo, anda por aí como um leão que ruge, procurando alguém para devorar”.

Enquanto a HTLH diz que o diabo “anda por aí”, outras versões preferem dizer que o anjo caído “ronda em volta” (NBV) ou “gira continuamente” (J. B. Philips). Em outras palavras, o diabo não para, o diabo quer fazer vítimas.

A denúncia de Simão Pedro é ex cathedra, isto é, ele fala com autoridade, pois foi uma das pessoas que o diabo procurou e conseguiu abocanhar, na casa do sumo sacerdote Caifás, na Sexta-Feira da Paixão, pela manhã (Mt 26.26-75).

As voltas do diabo pela terra têm o propósito de descobrir brechas ou fendas no caráter dos cristãos pelas quais possa entrar. O diabo é um catador de rachaduras nas paredes e de goteiras nos telhados. A figura da brecha é usada pelos profetas: “vocês rejeitam a minha mensagem e põem a sua confiança e a sua fé na violência e na mentira [e] esse pecado será como uma brecha que vai se abrindo num muro alto: de repente, o muro desmorona (Is 30.13).

O amor ao dinheiro foi a grande brecha no caráter de Judas. O Evangelho segundo João registra: “Assim que Judas recebeu o pão [a senha pela qual o traidor seria revelado], satanás entrou nele” (Jo 13.27).

É preciso tomar cuidado com as rachaduras da vida. Talvez a mais comum e a mais perigosa de todas seja a busca de nome, de poder, de posições cada vez mais altas e de glória. Essa sede é inata. O seu “quase ápice” é quando alguém se passa por Deus. E o ápice é quando alguém se julga mais do que Deus.

As andanças do diabo “por aí” ou “por aqui e por ali” podem sem vista nas palavras de Jesus. O Senhor se refere a um espírito imundo que sai de um homem, vai para um lugar deserto em busca de repouso e, algum tempo depois, volta ao lugar anterior (Mt 12.43-45).

Já que a realidade, por enquanto, é esta, Pedro ordena: “Tenham autocontrole e fiquem alertas” (na tradução de Simon Kistemaker). É necessário enfrentar o diabo. Tiago aconselha a mesma providência e garante: “Enfrentem o diabo e ele fugirá de vocês” (Tg 4.7)

É essa vitória específica que nós cantamos no “Castelo forte”, de Lutero:

Se nos quiserem devorar
demônios não contados,
não nos iriam derrotar.
Nem ver-nos assustados.
O príncipe do mal,
com seu plano infernal,
já condenado está!
Vencido cairá
por uma só palavra!

Abertura da Revista Ultimato. NOVEMBRO-DEZEMBRO 2011. ANO XLIV. Nº 333

sábado, 10 de dezembro de 2011

A mortedo "EU"

Por Leonardo Golçalves
Quem é o homem? Essa é certamente uma pergunta intrigante, e ao longo da história, muitos filósofos, sociólogos e religiosos tentaram responde-la. No entanto, nós que somos cristãos, devemos buscar na bíblia a resposta para essa pergunta. E diferente do que possa opinar a maioria dos evangélicos, o ser humano não é essa criatura maravilhosa, cheia de valor intrínseco, um ser virtuoso de invejável caráter. Infelizmente, muitos dos nossos pastores estão dominados pela autolatria e apresentam o homem como uma criatura que, de tão maravilhosa, fez com que Deus se apaixonasse por ela, sendo ele mesmo (o homem) merecedor de toda honra e glória. Porém não é assim que a Bíblia diz. Ela, a Palavra de Deus, descreve o homem como um ser maligno, recheado de perversas intenções, obstinado e rebelde, totalmente incapaz de praticar a virtude com motivações puras e santas, totalmente perdido; enfim, perversamente pecador.
Essa criatura foi tão terrivelmente “enfeiurada” pelo pecado, que mesmo tendo ainda um resquício do reflexo do seu criador, ainda é mais parecida com o diabo, a quem desde a queda é atribuída a sua paternidade. Suas ações são ações imundas, seu coração é enganoso e perverso e nele, o pecado foi escrito com ponta de diamante. Ele é totalmente incapaz de, por si, converter-se em alguém melhor. Tal como o etíope não pode mudar a cor da sua pele, ou como o leopardo não pode mudar as suas manchas, assim também o ser humano, sendo continuamente ensinado no caminho da maldade, não pode converter a si mesmo. É por isso que ele precisa da graça de Deus.
E o que é graça? Graça é justamente a expressão da gratuidade de Deus. Não é a recompensa das nossas obras (já que isso seria mérito), mas um galardão sem obras. Ela existe justamente porque não merecemos coisa alguma de Deus, somos mais maus do que bons, erramos mais do que acertamos, pecamos mais do que oramos, somos injustos com as pessoas que nos amam, defraudamos amigos, somos infiéis nos contratos e compromissos e as vezes, quando nos vemos em momentos de extrema pressão e dificuldade, nos rebelamos contra a única pessoa que sempre esteve do nosso lado, isto é, Deus. Ao menor sinal de tribulação, ventilamos com Ele a nossa indignação, muitas vezes culpando-o injustamente pelos nossos desmantelos e fracassos.
Não se iluda, caro amigo, pois o homem é isso aí: Egoísta, não enxerga outra pessoa senão a si próprio. Egocêntrico, deseja que o mundo gire ao redor do seu próprio umbigo. Ególatra, idolatra a si mesmo e pensa que Deus e o universo tem o dever de trabalhar em seu favor. Inclinado ao pecado, seguirá para sempre interessando-se por aquelas coisas que, por vergonhosas que são, destroem a alma e fatalmente nos afastam de Deus. Em poucas palavras, somente um milagre para colocar esse homem no céu. Ou ainda, usando as palavras do próprio Jesus, só nascendo de novo!
Mas o que isso tem a ver com “a morte do eu”? Simplesmente tudo. Em nossa cultura de autovalorização, tendemos a exagerar no amor próprio e a fazer um alto juízo acerca de nós mesmos. Julgamos-nos melhores do que somos, e, portanto, mais dignos das afeições das demais pessoas. E por conta disso, muitos de nós vivemos com a impressão de que fomos defraudados, humilhados, ou mesmo deixados de lado (o que para o orgulhoso, é a pior forma de humilhação). “Quem ela pensa que é para agir assim comigo?”, reclamamos. “Quem é ele para desligar o telefone na minha cara?”, murmuramos. “Quem essa pessoa pensa que é para me deixar esperando assim?”, nos queixamos. Não é assim que acontece? E por que atuamos assim? Por orgulho. Simplesmente orgulho.
É claro que as pessoas precisam tratar-se da melhor maneira possível, especialmente os cristãos. A regra de ouro, “O que quereis que os homens vos façam, assim façais vós também” continua valendo. Não dá para achar que é normal a atitude de quem facilmente destrata as pessoas. Não obstante a pergunta mais importante é: “Como devemos reagir a situações como estas?” Devemos reclamar, queixar-nos, botar a boca no trombone, exigir nossos pretensos direitos, ou suportar calados, sofrer a afronta, encarar com humildade a humilhação sabendo que o sofrimento tem um caráter pedagógico e através dele Deus aperfeiçoa nossa vida e molda nossa personalidade?
Eu sei que você, amigo leitor, é plenamente capaz de “exigir seus direitos” e se impor em uma situação constrangedora como as que mencionamos aqui. Mas quantos de nós somos também capazes de suportar a humilhação, para a glória de Deus?
Eu imagino o quanto você deve estar confuso ao ler isso. E não culpo você. Infelizmente, a versão de cristianismo que foi ensinada a nós estava impregnada de jargões triunfalistas e estivemos expostos a mensagens assim por tempo demais. Frases como “Deus te chamou para ser cabeça, e não cauda”, “Você deve estar sempre por cima e nunca por baixo”, “Você está destinado a vencer!” fizeram a nossa cabeça por muito tempo e uma mudança de paradigmas é sempre dolorosa. É triste, mas o evangelho triunfalista dos telepastores, em lugar de nos unir a Deus e a Cristo, acabou separando-nos das verdades importantes do cristianismo. Por isso, mensagens como “levar a Cruz”, “morrer para nós mesmos”, “suportar a afronta” e “não pagar mal com mal” se tornaram enormemente impopulares.
E a raiz do problema, onde está? Na supervalorização que fazemos de nós mesmos. Temos um autoconceito superior aquele que deveríamos ter, pois no fim das contas, nós não somos absolutamente nada. Não somos os bons, nem os maiorais, nem merecedores de coisa alguma. Nossos pecados encheram a taça da ira de Deus, e a única coisa que poderíamos conquistar com nossos méritos é a sentença de condenação eterna no inferno! Por isso, toda atenção, carinho e apreciação que recebemos das pessoas, não podem ser atribuídas a alguma espécie de dívida delas conosco, mas à pura e preciosa graça de Deus. Entendeu?
Não merecemos palavras gentis, não merecemos tapa nas costas nem estrelas douradas na testa. Se a bíblia é verdadeira como afirmamos ser, então nós somos uns grandíssimos nadas, sustentados pela graça de Deus, da qual todos dependemos para viver, nos mover e existir.
Por isso, da próxima vez que alguém pisar na bola com você, ou te der um tratamento aquém daquele que você julga ser merecido, em lugar de irritar-se com a situação, experimente abaixar a cabeça. Use essa situação a seu favor, pois tais circunstancias costumam ser excelentes oportunidades para aniquilar o nosso ego, que é este ídolo que carregamos dentro do peito e que sempre se acha mais do que realmente é.

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Apenas um vaso de barro - João Calvino (1509-1564)

2Co4.7 - Temos, porém, este tesouro. Quem ouvisse Paulo ostentar de forma tão extremada a excelência de seu ministério, e visse ao contrário quão ignóbil e abjeto era ele aos olhos do mundo, concluiria que sua ostentação era infantil e em si mesma estulta e ridícula, uma vez que baseavam seu julgamento na insignificância de sua pessoa externa. Os ímpios, especialmente, se aferravam a este fato como um pretexto que corroborava para que lançassem tudo sobre Paulo com desprezo. Porém, com a maior habilidade, ele revertia em maior triunfo as mesmas coisas que aos olhos dos ignorantes pareciam mais degradar do que glorificar seu apostolado. Primeiramente, ele se utiliza da metáfora do tesouro que geralmente não é guardado numa caixa esplêndida e ricamente decorada, senão que é depositado em algum recipiente vulgar, sem qualquer atrativo. Ele, então, adiciona que é assim que o poder de Deus é mais sublimemente glorificado e mais claramente percebido.


É como se dissesse: "Os que usam o aviltamento de minha pessoa como escusa para denegrir a honra de meu ministério, são juízes injustos e irracionais, porque um tesouro não se torna menos valioso por ser depositado num recipiente sem qualquer valor. De fato, esta é uma prática muito comum, pois grandes tesouros têm sido guardados em potes de cerâmica. Dessa forma, eles não compreendiam que as coisas foram tão bem ordenadas pela providência especial de Deus, de modo que nos ministros não deve haver qualquer aparência de excelência, a fim de que nenhuma grandeza propriamente sua obscureça o poder de Deus. Portanto, uma vez que a condição abjeta dos ministros, e a insignificância externa de suas pessoas, propiciam ocasião de Deus receber maior glória, é insensato e errôneo medir a dignidade do evangelho pela pessoa dos que o pregam." Porém, aqui Paulo está falando não apenas da condição dos homens, em geral, mas está avaliando a sua própria situação pessoal, embora seja verdade que todos os mortais não passam de vasos de barro. Tome-se o mais eminente dos homens que se puder encontrar, alguns maravilhosamente dotados de todos os dotes de berço, como intelecto e fortuna, mesmo que seja ele um ministro do evangelho, não passará de um indigno e terreno depositário de um inestimável tesouro. Não obstante, Paulo está pensando em si mesmo e em seus associados, os quais eram frequentemente tratados com desdém precisamente porque nada possuíam de externo para exibirem.

2Co4.8. Embora sejamos premidos de todos os lados. Isto é adicionado à guisa de explicação, com o fim de mostrar que a sua condição abjeta, longe de denegrir a glória de Deus, antes servia para promovê-la. "Porque", diz ele, "somos reduzidos a humilhação, mas, por fim, o Senhor abre uma via de escape; somos oprimidos com pobreza, mas o Senhor vem em nosso socorro. Muitos inimigos estão de mãos dadas contra nós, mas na proteção do Senhor estamos seguros. Noutras palavras, ainda que sejamos reduzidos a nada, ao ponto que todos pareçam superiores a nós, contudo não pereceremos." A última possibilidade mencionada, de todas é a mais séria. Veja-se como reverte ele em vantagem todas as acusações que os ímpios lhe assacavam.


segunda-feira, 28 de novembro de 2011

A graça de Deus, favor imerecido

A salvação do homem é vista pelas religiões do mundo inteiro apenas de dois modos: o homem é salvo pelos seus méritos ou pela graça de Deus. A salvação é um caminho aberto pelo homem da terra ao céu ou é resultado do caminho que Deus abriu do céu à terra. O homem constrói sua própria salvação pelo seu esforço ou recebe a salvação como dádiva imerecida da graça divina. Não existe um caminho alternativo nem uma conexão que funde esses dois caminhos. É impossível ser salvo ao mesmo tempo pelas obras e pela graça; chegar ao céu pelo merecimento próprio e ao mesmo tempo através de Cristo.

A soberana graça de Deus é o único meio pelo qual podemos ser salvos. Os reformadores ergueram a bandeira do Sola Gratia, em oposição à pretensão do merecimento humano. Queremos destacar quatro pontos importantes no trato dessa matéria.

1. A graça de Deus é um favor concedido a pecadores indignos. Deus não nos amou, escolheu, chamou e justificou por causa dos nossos méritos, mas apesar dos nossos deméritos. A causa da salvação não está no homem, mas em Deus; não está no mérito do homem, mas na graça de Deus, não está naquilo que fazemos para Deus, mas no que Deus fez por nós. Deus não nos amou porque éramos receptivos ao seu amor, mas amou-nos quando éramos fracos, ímpios, pecadores e inimigos. Deus nos escolheu não por causa da nossa fé, mas para a fé; Deus nos escolheu não porque éramos santos, mas para sermos santos; não porque praticávamos boas obras, mas para as boas obras; não porque éramos obedientes, mas para a obediência.

2. A graça de Deus é concedida não àqueles que se julgam merecedores, mas àqueles que reconhecem que são pecadores. Aqueles que se aproximam de Deus com altivez, cheios de si mesmos, ostentando uma pretensa espiritualidade, considerando-se superiores e melhores do que os demais homens, são despedidos vazios. Porém, aqueles que batem no peito, cônscios de seus pecados, lamentam sua deplorável condição e se reconhecem indignos do amor de Deus, esses encontram perdão e justificação. A graça de Deus não é dada ao homem como um prêmio, é oferta imerecida; não é um troféu de honra ao mérito que o homem ostenta para a sua própria glória, mas um favor que recebe para que Deus seja glorificado.

3. A graça de Deus não é o resultado das obras, mas as obras são o resultado da graça. Graça e obras estão em lados opostos. Não podem caminhar pela mesma trilha como a causa da salvação. Aqueles que se esforçam para alcançar a salvação pelas obras rejeitam a graça e aqueles que recebem a salvação pela graça não podem ter a pretensão de contribuir com Deus com suas obras. A salvação é totalmente pela graça, mediante a fé, independente das obras. As obras trazem glória para o homem; a graça exalta a Deus. A graça desemboca nas obras e as obras proclamam e atestam a graça. As obras são o fruto e a graça a raiz. As obras são a consequência e a graça a causa. As obras nascem da graça e a graça é refletida através das obras.

4. A graça de Deus é recebida pela fé e não por meio das obras. A salvação que a graça traz em suas asas é recebida pela fé e não por meio das obras. Não somos aceitos diante de Deus pelas obras que fazemos para Deus, mas pela obra que Cristo fez por nós na cruz. A fé não é meritória, é dom de Deus. A fé é o instrumento mediante o qual tomamos posse da salvação pela graça. O apóstolo Paulo sintetiza este glorioso ensino, em sua carta aos Efésios: “Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie. Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas” (Ef 2.8-10).

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

O olhar de cada um!

Essa semana li uma reportagem de um médico californiano que promete técnica a lazer, que transforma olhos castanhos em azuis. Embora ainda não aprovado nos Estados Unidos, testes foram realizados e muitos já estão de ‘olho’ para investir alguns milhares de dólares e conseguir o tão sonhado olhar azul.


As Escrituras Sagradas nos ensinam acerca do olhar. Veja que após criar todas as coisas, Deus viu tudo o que fizera e era tudo muito bom (Gn 1.31). Adão quando vê a mulher que Deus criara para ele, faz poesia e se alegra (Gn 2.22-23). É o olhar da contemplação, da satisfação, da gratidão! Já no relato da desobediência (Gn 3) encontramos a declaração: “Vendo a mulher que a árvore era... agradável aos olhos... tomou do fruto e comeu e deu também ao marido, e ele comeu”. O olhar da cobiça, da desobediência, da queda!



O olhar, então, pode tomar dois caminhos: o caminho do enxergar, julgar,concluir e satisfazer-se adorando a Deus em obediência, e o caminho do enxergar e ser tentado, ser seduzido, sucumbindo em pecado pela desobediência a Deus. Após uma derrota no projeto de conquista da terra prometida, Josué ora a Deus perguntando o porquê daquela situação. Deus responde dizendo haver pecado no meio do povo e mostra o culpado: Acã. A confissão de Acã reafirma o cuidado que devemos ter com nosso olhar: “Quando vi entre os despojos uma boa capa babilônica, e duzentos siclos de prata, e uma barra de ouro do peso de cinquenta siclos, cobicei-os e tomei-os; e eis que estão escondidos na terra, no meio da minha tenda, e a prata, por baixo.” (Josué 7:21). Davi e Jó, personagens bíblicos bem conhecidos, afirmam ter feito um compromisso em cuidar do que olham para não pecar contra Deus – Jó 31.1; Sl 101.3.


Aprendemos com Jesus a olhar para a Sua criação e contemplar toda grandeza e beleza presentes (você tem conseguido fazer isso?), para enxergar o cuidado, a provisão e o propósito de Deus por trás de tudo isso, experimentando descanso e vitória sobre a ansiedade – Mateus 6.25-34. Mas também aprendemos com Jesus a ter cuidado com o que olhamos, pois pode nos levar ao pecado – Mateus 5.28-29.


Olhemos dois olhares distintos. Abrão era muito rico. Com ele estava seu sobrinho Ló, que também foi ficando muito rico. Certa vez os empregados dos dois entraram em conflito, pois eram muitos habitando em um lugar que não estava mais comportando toda multidão
de rebanho. Antes de a contenda chegar ao tio e sobrinho, Abrão deu liberdade a Ló para escolher para onde ir, uma vez que a busca de novos campos era a solução. O texto bíblico registra: “Levantou Ló os olhos e viu toda a campina do Jordão, que era toda bem regada (antes de haver o Senhor destruído Sodoma e Gomorra), como o jardim do Senhor, como a terra do Egito, como quem vai para Zoar.” (Gênesis 13:10). Não é preciso dizer que após esta olhada, Ló escolheu ficar com a campina do Jordão, local bastante fértil. Ló é um homem natural, que pensa primeiro nele, em suas necessidades. Quer garantir seu amanhã, ele quer as coisas prontas. Ir para o deserto dá trabalho. Ele busca a facilidade, evita desafios, faz escolhas pela lógica e não consulta a Deus: este é o olhar de Ló!


Após a decisão de Ló, Abrão segue seu caminho em outra direção. Deus vai até ele e diz: “... Ergue os olhos e olha desde onde estás para o norte, para o sul, para o oriente e para o ocidente; porque toda essa terra que vês, eu te darei, a ti e à tua descendência, para sempre.” Gn 13.14b-15. No meio do nada Abrão é levado por Deus a olhar para o futuro. O olhar de Abrão é dirigido por Deus. Deus está do seu lado! Talvez ainda sem entender toda a dimensão daquela visão, Abrão se entrega e confia que o Deus que o levou até ali, o levará até o final. O Deus que o chamou está presente guiando sua história, provendo os recursos. Abrão crê e adora a Deus (Gn 13.18): este é o olhar de Abrão!


Como anda seu olhar? A forma como olhamos define como vivemos!

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

A conversão de Saulo, conversão pela graça

Para ler: Atos 9:1-31

Segundo John Stott em sua série intitulada: A Bíblia Fala Hoje, A Mensagem de ATOS Até os Confins da Terra, o Apóstolo Paulo quando de sua conversão, estabelece que “ a graça de Deus o capturou, inundou seu coração e o inundou como uma enchente”. Ainda segundo ele, “essa variedade de imagens lembra outra série de metáforas usadas por C. S. Lewis nos últimos capítulos de sua autobiografia. Sentindo que Deus o buscava implacavelmente, ele o compara com o “grande pescador” fisgando seu peixe, a um gato caçando um rato, a um bando de cães de raça encurralando uma raposa e, finalmente, a um enxadrista divino colocando-o na posição mais desvantajosa, até que, enfim, reconhece o “xeque mate” “ ¹.

De fato a graça de Deus é soberana, pois, “nEle vivemos, e nos movemos, e existimos, como alguns dos vossos poetas têm dito: Porque Dele também somos geração (At. 17:28). E ainda mais, “Assim, pois, não depende de quem quer ou de quem corre, mas de usar Deus a sua misericórdia (Rom. 9:16) quando o Apóstolo Paulo se refere a doutrina da eleição. Contudo, embora a atração de Deus seja irresistível, Seus desígnios sejam insondáveis e imutáveis, quanto à conversão a Cristo, cabe ressaltar certos esclarecimentos. Vejamos o que John Stott sabiamente considera tomando como base a conversão de Saulo de Tarso:  

[...] Entretanto, creditar a conversão de Saulo à iniciativa de Deus pode, facilmente, causar-mal entendidos, e precisa receber dois esclarecimento: a graça soberana que conquistou Saulo não foi repentina (no sentido de que não tenha havido preparação anterior) nem compulsiva (no sentido de que ele não tinha opção).
[...] Resumindo, a causa da conversão de Saulo foi graça, a graça soberana de Deus. Mas a graça soberana é uma graça gradual e suave. Gradualmente, sem violência, Jesus picou a mente e a consciência de Saulo com seus aguilhoes (v. 5). Então ele se revelou através da luz e da voz, não para esmagá-lo, mas de um modo que Saulo pudesse responder livremente. A graça divina não atropela a personalidade humana. Pelo contrário, faz com que os seres humanos sejam verdadeiramente humanos. É o pecado que encarcera; a graça liberta. Portanto, a graça de Deus nos liberta da escravidão do nosso orgulho, preconceito e egocentrismo, fazendo-nos capazes de nos arrepender e crer. Não podemos fazer outra coisa, senão engrandecer a graça de Deus que teve misericórdia de um fanático enfurecido como Saulo de Tarso, e de criaturas tão orgulhosas, rebeldes e obstinadas como nós.
C. S. Lewis, cuja consciência de ter sido perseguido por Deus já foi mencionada anteriormente, também expressou seus sentimentos de liberdade em resposta a Deus:
Conscientizei-me de que estava em apuros, segurando ou barrando alguma coisa. Ou, se você quiser, que eu estava vestindo uma roupa rígida, como um espartilho, ou talvez uma armadura, como se fosse uma lagosta. Eu senti, naquele exato momento, que eu tinha ganhado uma liberdade de escolha. Eu poderia abrir a porta ou mantê-la fechada; poderia tirar aquela armadura ou permanecer com ela. Nenhuma escolha era obrigatória; nenhuma ameaça ou promessa estava ligada a ela; apesar disso, sabia que abrir a porta ou sair da armadura significaria o incalculável. A escolha parecia solene, mas ela também parecia estranhamente não-emocional. Eu não era movido por desejos nem medos. Em certo sentido, não era movido por coisa alguma. Decidi abrir, soltar, tirar as rédeas. Disse “eu escolho”, mas ao mesmo tempo não parecia ser, mesmo, possível fazer o contrário. Por outro lado, eu não via nenhum estímulo. Você poderia argumentar que eu não era nenhum agente livre, mas estou mais inclinado a pensar que foi um dos atos mais livres que já realizei. Necessidade não precisa ser o contrário de liberdade, e talvez o homem seja mais livre quando, em vez de procurar motivos, ele pode dizer, “Eu sou o que faço”. [...]
[...] Conclusão
Consideramos as causas e efeitos da conversão de Saulo. O que mais nos impressiona é a graça de Deus que causou efeitos tão grandiosos, agarrando um rebelde obstinado com ele e transformando-o completamente de “lobo em cordeiro” ². A história de Lucas deveria persuadir-nos a pensar mais de Deus em relação aos incrédulos e aos recém-convertidos.
Quanto aos incrédulos, existem muitos Saulos de Tarso no mundo. Como ele, são intelectualmente bem dotados e têm caráter; homens e mulheres de personalidade, energia, iniciativa e impulso; tendo a coragem de suas convicções seculares; profundamente sinceros, mas profundamente enganados; viajando de Jerusalém para Damasco, e não de Damasco para Jerusalém; duros, teimosos, até mesmo fanáticos, em sua rejeição de Jesus Cristo. Mas eles não estão fora do alcance de sua graça soberana. Precisamos ter mais fé, mais expectativa santa, que nos levarão a orar por eles (como, com certeza, os cristãos primitivos oraram por Saulo) para que Cristo primeiro pique com seus aguilhões para depois agarrá-los definitivamente.
Mas nunca devíamos nos dar por satisfeitos com a conversão de uma pessoa. Isso é a penas o começo. A mesma graça que leva a pessoa ao novo nascimento é capaz de transformá-la à imagem de Cristo³. Todo novo convertido se torna uma pessoa transformada, e recebe novos títulos para provar esse fato: ele é um “discípulo” (v. 6) ou “santo” (v. 13) que tem uma nova relação com Deus, um “irmão” (v. 17) ou irmã que tem uma nova relação com o mundo. Se esses três relacionamentos – com Deus, a igreja e o mundo – não são vistos em um convertido confesso, temos boas razões para questionar a realidade de sua conversão. Mas sempre que sua presença for visível, temos bons motivos para engrandecer a graça de Deus.
Sola scriptura, sola gratia, sola fide, soli Del glória, solus Christus.
Notas:
1.    Surprised by joy, C. S. Lewis (Geoffrey Bless, 1955; Collins reimpressão, 1986) pp. 169-183.
2.    Calvino, II p. 273.
3.    E.g. 2 Co 3:18.           

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Verdades sobre a Reforma que ainda precisamos resgatar

Por Alan Brizotti
Estamos na Semana da Reforma. 31 de outubro de 1517, Wittenberg, Alemanha. Um novo tempo começava, das ânsias guardadas no cerne de corações inflamados, surge uma nova forma, Reforma. Como um abençoado eco de Wycliffe (1328-1384), cujos ossos foram queimados trinta anos depois de sua morte, e de John Huss (1373-1415), o “ganso” que profetizou sobre o “cisne”, um tempo de redescobertas começava.

Na porta da igreja do castelo de Wittenberg, 95 teses começavam a desmontar uma história de opressão teológica. A vida de Lutero era marcada por um demolidor peso de culpa e senso absurdo do pecado, até o dia em que ele se depara com Rm.1.17, onde sua mente é aberta para a verdade transformadora da justificação por graça e fé. No século XIX, a frase mais conhecida da Reforma seria popularizada: “Ecclesia reformata et semper reformanda est” (“A igreja reformada está sempre se reformando”).

Quais são as principais verdades sobre a Reforma que ainda precisamos resgatar?

I – O resgate da justificação do pecador por graça e fé

Questão central do Evangelho: Como podemos, míseros pecadores, ser alvos da graça de Deus? John Stott dizia que “ninguém entende o cristianismo, se não entende a palavra ‘justificado’". A justificação por graça e fé começa onde há libertação dos esquemas de merecimento: indulgências, peregrinações, penitências, ativismo eclesiástico.
Reafirmar esse princípio nos leva a desmascarar teologias que priorizam o ter em detrimento do ser. É o efeito Lutero destruindo a tirania do merecimento.

II – O resgate da autoridade normativa das Escrituras

A redescoberta do evangelho tem passagem obrigatória pela oração e estudo da Palavra. Na época de Lutero, a hermenêutica estava presa aos esquemas próprios e tendenciosos de interpretação da igreja. A reforma afirma que as Escrituras têm autoridade suprema sobre qualquer ponto de vista humano. Não somos chamados a pregar uma teologia, mas o evangelho!

Lutero dizia que “no momento em que lemos a Bíblia é quando o Diabo mais se apresenta, pois tenta nosso coração a interpretar as verdades lidas segundo nossa própria vontade, e não segundo a vontade soberana de Deus”.

É preciso redescobrir a centralidade da Palavra. Reafirmar esse princípio nos leva hoje a questionar nossa hermenêutica, a assumir uma atitude bereana (At. 17. 10, 11), uma atitude de quem pensa.

III – O resgate da igreja como comunhão dos santos

Lutero amava a igreja, não queria dividi-la, mas oferecer-lhe um caminho de cura. A igreja era governada pelo Papa, e não por Cristo. Somente o clero possuía a Bíblia, isso sem falar no acúmulo de riquezas e poder da igreja enquanto o povo sofria na miséria (isso lembra alguma coisa?). Para Lutero, a igreja é o “autêntico povo de Deus”, os líderes servem à igreja, e não podem se servir dela. Por isso Lutero reafirmou o sacerdócio geral de todos os crentes – todo cristão tem a responsabilidade de anunciar o evangelho.

Reafirmar esse princípio hoje, numa sociedade do egoísmo, do individualismo e da indiferença, é assumir um chamado ao arrependimento. Esse arrependimento abrange todos os “caciques denominacionais” que ainda exploravam o povo, até às mentalidades ingênuas que, por preguiça mental, nunca progridem na fé.

IV – O resgate da liberdade do cristão

Lutero redescobre o prazer de ser livre. Como somente Deus é livre, ele nos concede a liberdade por meio de Jesus Cristo (Jo. 8.31,32 e 36). Lutero perguntava: “para que serve a liberdade do cristão?”, ao que ele mesmo respondia: “o cristão é livre para amar”. Estamos dispostos a amar hoje?

Reafirmar esse princípio significa reavaliar todo e qualquer sistema de submissão opressiva, legalismos asfixiantes, estreitamentos neurotizantes, experiências carismáticas carentes de misericórdia, que destroem a liberdade.

V – O resgate da centralidade da cruz de Cristo

Através da libertação em Cristo, o cristão se torna “um Cristo para os outros”(Lutero), portanto, quem é cristão não pode dominar sobre os seus semelhantes, sob pretexto algum. Antes, solidariza-se com o sofredor, ajudando-o a carregar a cruz. Na cruz, o cristão vê crucificado o mundo. Dela vem a nossa vocação para estabelecer o reino de justiça, igualdade e paz. É o sinal supremo do amor de Deus.

Reafirmar esse princípio significa voltar à verdade de que não somos celebridades, mas servos. Como um cristão do passado dizia, “a vida oferece somente duas alternativas: autocrucificação com Cristo ou autodestruição sem ele”.

Somos chamados a discernir o espírito de cada época. Será que estamos dispostos a assumir o “efeito Lutero” em nossa prática teológica atual? Que a igreja seja sempre uma “igreja reformada, sempre se reformando”.
Alan Brizotti homenageando a reforma no Genizah


quarta-feira, 26 de outubro de 2011

A Lei e o Evangelho




Fred Malone

Dr. Fred Malone serviu como pastor da First Baptist Church em Clinton, Louisiana. Ele obteve seu bacharelado pela Auburn University, seu M.Div. pelo Reformed Theological Seminary e seu Ph.D em Novo Testamento pelo Southwestern Baptist Theological Seminary. Dr. Malone é membro do Conselho de diversas organizações, incluindo Founders Ministries, Southern Baptist Theological Seminary, o Conselho Administrativo da Association of Reformed Baptist Churches in America e o Institute of Reformed Baptist Studies at Westminster Seminary na California. É autor de vários livros e artigos teológicos, professor e palestrante em conferências e seminários teológicos.

Se eu pudesse melhorar a eficácia das pregações pastorais e o cuidado pastoral na igreja, convocaria todos os pastores para assimilar a doutrina da Lei e o Evangelho nas Escrituras. Quando pela primeira vez fui servir como sócio de Ernie Reisinger em 1977, ele exigiu que eu estudasse Romanos 6.14 sobre a Lei e o Evangelho e colocou em minhas mãos um livro: The True Bounds of Christian Freedom (Os Verdadeiros Laços da Liberdade Cristã) de Samuel Bolton. O livro de Ernie sobre a Lei e o Evangelho contém muito daquilo sobre o que conversamos naqueles dias.

Há muita controvérsia e ignorância sobre esta doutrina nos dias de hoje. Os erros nesta doutrina desovaram o dispensacionalismo, a teonomia, a nova perspectiva de Paulo, o hiperconvencionalismo, o legalismo, o antinomianismo, o evangelismo sem profundidade, a santificação superficial, os erros de adoração e o misticismo antibíblico. Mas os nossos antepassados reformados e batistas de um modo geral não sucumbiram a tais erros antes de 1900. Por que não? Creio que foi porque compreendiam a doutrina bíblica da Lei e do Evangelho. Pode-se vê-lo na suas declarações de fé e suas obras. [1] Espero que os pastores de hoje, especialmente os pastores batistas, tornem a estudar esta doutrina e reformulem suas vidas e ministérios através dessas verdades.

Charles Bridges, autor de The Christian Ministry (O Ministério Cristão), disse:

O sinal de um ministro "aprovado, como obreiro que não tem do que se envergonhar" é o "que maneja bem a palavra da verdade."... Esta revelação é dividida em duas partes — a Lei e o Evangelho — essencialmente diferentes; mas tão intimamente ligadas, que o conhecimento exato de uma não pode ser obtido sem a outra. [2]

Se o entendimento da doutrina da Lei e do Evangelho é tão importante, então cada seminário deveria ensiná-la corretamente e cada pastor deveria dominá-la. Neste pequeno artigo, vamos examinar a doutrina esquadrinhando Romanos 6.14, exegeticamente e pastoralmente.

Exegeticamente
"Porque o pecado não terá domínio sobre vós; pois não estais debaixo da lei, e sim da graça" (Romanos 6.14).

O contexto deste versículo é a discussão de Paulo sobre santificação. Paulo ensinou que todos pecaram e perderam a glória de Deus (Romanos 1-3). Também ensinou que os pecadores arrependidos foram de uma vez por todas justificados somente pela fé em Cristo (Romanos 4-5). Essa justificação uma-vez-por-todas talvez atraia alguns a procurar vantagens na graça de Deus e continuar a pecar para que a graça abunde (6.1). Mas Paulo rejeitou tal pensamento sobre santificação como impossível para o homem justificado (Romanos 6-8). Por quê? Porque "o pecado não terá domínio (autoridade, governo, tirania) sobre vós; pois não estais debaixo da lei, e sim da graça" (6.14).

Esta não é uma declaração imperativa, uma ordem para obedecer. É uma declaração de fato, indicativa. Poderíamos chamá-la de promessa de Paulo aos cristãos romanos. Esta declaração explica por que é impossível para o homem justificado viver sob o domínio do pecado como acontece com o que não é convertido. Ele está debaixo da graça. Estar debaixo da graça é ficar livre da escravidão do pecado, que é o estado natural de todos os homens debaixo da lei. Deus não vai permitir a tirania do pecado na Nova Aliança de Jesus Cristo (Jeremias 32.40). "Vamos pecar para que a graça abunde" não deve ser o princípio que opera nos que foram justificadas de-uma-vez-por-todas pela fé somente (Romanos 5.1-2). Alguma coisa que existe debaixo da graça não permite. Tudo mais é fé falsa, ainda debaixo da lei.

Debaixo da Lei

Se Paulo estivesse falando apenas a cristãos judeus, debaixo da lei poderia ser uma referência principalmente à Aliança do Sinai, como em Hebreus. Contudo, os cristãos romanos eram principalmente gentios. Estar debaixo da lei nesta passagem não pode significar que estivessem antes debaixo da lei ou da aliança mosaica. Mas Paulo diz que esses gentios estavam antes debaixo da lei e, portanto, condenados sob o domínio do pecado.

Paulo explica que todos os homens estão "debaixo da lei" no que se refere a Deus em Adão como a cabeça da raça humana e, portanto, condenados pela transgressão de Adão (Romanos 5.12-19):

"Portanto, assim como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte, assim também a morte passou a todos os homens, porque todos pecaram... Pois assim... por uma só ofensa, veio o juízo sobre todos os homens para condenação... (Romanos 5.12,18).

Adão foi colocado debaixo da lei como princípio operante em seu relacionamento com Deus. Se ele obedecesse as Leis Divinas perfeitamente, seria abençoado; se as desobedecesse, seria amaldiçoado. Esta aliança-da-lei com Adão geralmente é chamada de Aliança das Obras (da Vida, do Éden, etc.; Oséias 6.7). Deus também o declarou como cabeça e representante da aliança de toda a raça humana. [3] Portanto, todos os homens estão condenados no pecado de Adão contra a exigência divina da perfeita obediência à lei. No pecado de Adão contra as Leis Divinas, enquanto estava debaixo da lei de Deus, ele e todos os seus descendentes estavam debaixo da lei com ele e ficaram sob a condenação de Deus por deixar de guardar "a Lei" perfeitamente. Todos os homens nasceram debaixo do pecado porque nasceram condenados debaixo da lei na Aliança das Obras, tanto judeus como gentios (Romanos 3.19-20).

As Leis que todos os homens são culpados de transgredir debaixo da lei são mais do que a lei particular de não comer o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal. São as Leis Divinas morais, os dois grandes mandamentos, resumidos nos Dez Mandamentos, o reflexo da imagem de Deus no homem. Até os gentios, que não tiveram a revelação mosaica, fizeram "por natureza" as coisas "da Lei", com sua consciência dando testemunho, porque eles tinham a "Norma da Lei gravada no seu coração" como Adão tinha, embora agora estivessem corrompidos (Romanos 2.14-16).

O que a Lei era originalmente no coração de Adão debaixo da lei e continua escrita no coração de todos os homens? Em Romanos 2.14-16, esta Lei é definida no contexto como "a lei da natureza", o resumo dos Dez Mandamentos, que os judeus receberam depois e transgrediram (1.21,22;7.7; roubo, adultério, idolatria, cobiça). Assim, todos os homens estão condenados debaixo da lei por não obedecer perfeitamente à Lei de Deus.

Na verdade, "a força do pecado é a lei" (1 Coríntios 15.56). A Lei por si mesma pode apenas revelar a natureza santa de Deus, a imagem moral original de Deus no homem, e definir o pecado e a justiça. Ela em resumo desperta o pecado por nossa incapacidade de cumpri-la perfeitamente e não pode nos justificar (Romanos 7.8-10). Quanto mais tentamos cumpri-la para nos justificar diante de Deus, mais falhamos pecando. Todos os homens estão sob o domínio do pecado porque estão debaixo da lei diante de Deus. Portanto, o pecado é o nosso senhor enquanto estamos debaixo da lei.

Debaixo da Graça

Contudo, nosso texto também ensina que todos os cristãos verdadeiros, justificados uma-vez-por-todas, foram transferidos da condição debaixo da lei em Adão para debaixo da graça na autoridade e salvação de Cristo. Isto geralmente é chamado de Aliança da Graça. Embora a aliança de Adão fosse uma aliança com base na lei, a aliança de Cristo é uma aliança baseada na graça. Foi anunciada em Gênesis 3.15, profetizada através das "alianças da promessa" do Antigo Testamento e cumprida na Nova Aliança da graça de Jesus Cristo.

Estar em Cristo é estar debaixo da graça tão somente pela fé e não mais debaixo da lei para salvação por meio da obediência perfeita na aliança fracassada de Adão. Cada um permanece ou em Adão debaixo da lei ou em Cristo debaixo da graça, mas não em ambas as condições ao mesmo tempo. Por isso devemos pregar o Evangelho da graça a todos os homens.

Estar debaixo da graça significa que o pecado não pode ter domínio sobre nós porque a graça em Cristo nos liberta da condenação da perfeita obediência-à-Lei em Adão. Isso acontece através da vida de nosso Senhor de perfeita obediência-à-Lei e  da sua morte expiatória pelos transgressores da lei. Você não pode realmente entender a cruz sem entender a Lei. Debaixo da graça significa que Deus nos garante a justificação pela fé somente em Jesus Cristo através de Sua perfeita expiação pelo pecado e a imputação de Sua justiça perfeita como um dom. Também significa que o novo nascimento grava a Lei de Deus em nossos corações de modo que de novo temos nela prazer (Jeremias 31.31-34, 32.40; Romanos 7,22). Esta "graça na qual estamos firmes" por toda a caminhada cristã impele e fortalece o pecador perdoado a amar a Deus e guardar os Seus mandamentos sem medo da condenação. Debaixo da graça, o crente não sente mais que a obediência à Lei de Deus é um fardo que condena, mas um privilégio alegre dos salvos debaixo da graça (Romanos 3.24, 5.2, 5.15, 5.21, 6.14-15).

O cristão vive debaixo da graça de acordo com a Lei de Deus de modo que o pecado já não tem mais domínio sobre ele. Embora o cristão ainda cometa pecados contra os mandamentos de Deus mesmo debaixo da graça, o poder do pecado, que é a condenação da lei, foi quebrado. A santificação, então, é o exercício diário da fé salvadora em Cristo, redimido por Seu sangue e coberto com Sua justiça, pela fé justificadora na qual procuramos guardar a Lei de Deus debaixo da graça. Por isso Jesus disse: "Se me amais, guardareis os Meus mandamentos." A fé operante através do amor a Deus é a evidência de estar debaixo da graça. E essa fé sempre funciona.

Pastoralmente
Evangelismo

Tendo perdido a importância da Lei de Deus para revelar o pecado ao pecador, o evangelismo hoje tornou-se cada vez mais superficial. Mas "pela lei vem o pleno conhecimento do pecado" (Romanos 3.19-20). O pecado em muitas apresentações não aparece em termos de transgressão aos Dez Mandamentos e condenação diante de Deus. Portanto, o arrependimento também é deixado de fora. Como resultado, muitos que supostamente reagem ao convite do evangelho nunca se arrependeram da transgressão da lei e não se comprometeram a viver uma vida santa, obediente. Os registros em nossas igrejas batistas estão cheios deles. O verdadeiro evangelismo deve pregar o Evangelho da libertação do domínio do pecado debaixo da lei. Mas se a Lei não é usada para definir o pecado, como os pecadores saberão até que ponto são pecadores e a que tipo de vida santa estão se comprometendo?

Compreender que o Evangelho leva os pecadores a passarem da ilegalidade para a redenção e para a guarda-da-lei revitalizaria as apresentações evangelísticas e a pregação com uma explícita convocação para abandonar o pecado e seguir a Cristo como Senhor. Os erros do "cristão carnal" e o misticismo exaltado sem a orientação da Lei de Deus seriam resolvidos com o recebimento da salvação. Então a convocação para ser discípulo de Cristo seria mais do que uma política de seguro para o céu. Veríamos pecadores negando-se a si mesmos, assumindo a sua cruz diariamente e seguindo Jesus, que é uma descrição do discipulado (Mateus 16.24). Não é o que desejamos ver no evangelismo? Então temos de pregar a Lei e o Evangelho.

Santificação

Os mestres da vida cristã geralmente negligenciam a Lei de Deus por completo. A ênfase sobre "submissão completa... rededicação da vida a Cristo... segui-lo por onde Ele mandar... amar a Deus de todo o seu coração..." etc., não tem significado sem a Lei: "Se me amais, guardareis os meus mandamentos... Porque este é o amor de Deus: que guardemos os seus mandamentos; ora, os seus mandamentos não são penosos" (João 14.15; 1 João 5.3). Uma igreja não segue a Grande Comissão até que tenha feito discípulos, batizado e ensinado "a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado" (Mateus 28.18-20). A igreja que não está ensinando obediência fiel à Lei de Deus está desobedecendo a Grande Comissão. A igreja também não pode praticar a disciplina eclesiástica com fidelidade e consistência se não entender que "pela lei vem o pleno conhecimento do pecado... o pecado é a transgressão da lei" (Romanos 3.20; 1 João 3.4).

Pregação

Se a doutrina da Lei e do Evangelho está no centro da revelação de Deus ao homem para salvação e santificação, então os pastores devem ter o cuidado de pregar a Lei e o Evangelho de maneira adequada.

Para os não convertidos, precisamos ter certeza de que explicamos que eles estão debaixo da lei e não têm esperança de justificação e salvação-pelas-obras diante de Deus. Também precisamos lhes mostrar suas transgressões da Lei para que saibam que são pecadores condenados debaixo da lei e que devem se arrepender de suas transgressões-da-lei diante de Deus. Devemos lhes mostrar como Cristo cumpriu a Lei por eles e morreu para expiar suas transgressões-da-lei para que possam receber o perdão exatamente como um presente de graça. E devemos lhes mostrar que ao aceitar a salvação eles estão se comprometendo a amar Jesus Cristo e guardar os Seus mandamentos.

Para os convertidos, os pastores devem com certeza ensinar a Lei de Deus para explicar o que é a santidade. E quando ensinarem um mandamento aos santos devem ter certeza de que ensinam o Evangelho, que os santos estão debaixo da graça em Cristo quando procurarem obedecer, para não tropeçarem no orgulho, na arrogância ou na justiça-própria; ou no desespero de que sua obediência não é suficiente para Deus aceitá-los. Devemos esclarecer quando ensinarmos a obediência que "sendo justificados (uma-vez-por-todas), pois, mediante a fé, temos paz com Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo" (Romanos 5.1). Apenas aqueles que vivem pela fé debaixo da graça terão o consolo e a força de que "o pecado não terá domínio sobre vós; pois não estais debaixo da lei, e sim da graça" (Romanos 6.14). Muitas vezes tenho ouvido pastores convocando os santos a uma vida de santidade, obediência fiel aos mandamentos de Deus, sem lhes dar o consolo do Evangelho no caminho.

Conclusão

Entender a Lei e o evangelho de maneira adequada é a chave da vida e pregação Cristocêntricas. Nós o apresentamos como aquele que cumpriu a Lei para os pecadores debaixo da lei, que vicariamente assumiu suas transgressões da lei e o juízo merecido, morrendo então sobre a cruz em um sacrifício justo diante de Deus pelos injustos. "Aquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós; para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus" (2 Coríntios 5.21). Agora, chamamos a todos os que estão condenados debaixo da lei a se arrepender e aceitar pela fé a reconciliação debaixo da graça e a vida eterna.

E convocamos os salvos pela graça a viver pela fé com alegria debaixo da graça e estabelecer uma vida obediente, santa, guardando a Lei com amor pelo seu querido Salvador e Senhor, que disse: "Se me amais, guardareis os meus mandamentos" (João 14.15).

Este é o remédio para o evangelismo superficial, santificação superficial, membros de igreja sem conversão, misticismo desenfreado e desorientado, sem disciplina eclesiástica. A Lei e o Evangelho são diferentes, embora sejam amigos inseparáveis. A Lei dá apoio à pregação do Evangelho, revelando o significado e a glória da cruz. E o Evangelho, que salva da condenação da Lei, manda os remidos de volta para a Lei como uma regra de vida debaixo da graça.

Notas:

1. Veja Capítulo 19 – "Sobre a Lei de Deus" na Second London Baptist Confession (1689). Este capítulo também está incluído nos credos batistas de Filadélfia e Charleston aos quais muitos dos nossos antepassados Batistas do Sul se filiam.
2. Charles Bridges, The Christian Ministry (Edinburgh: The Banner of Truth Trust, 1976), 222.
3. James P.Boyce, Abstract of Systematic Theology (1887; reprint, Pompano Beach, Florida: Christian Gospel Foundation, 1979), 234-239.

Traduzido por: Yolanda Mirdsa Krievin
Copyright © Editora Fiel 2011

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